Direito e Software: Direitos Autorais e Mídias Digitais

Este texto foi produzido pela estudante Nathalia Orlandi Borin, a partir da palestra de Mariana Valente na Disciplina de Direito e Software, em 09/04/2019.

O Direito Autoral possui duas grandes vertentes: o copyright da lei norte-americana e os direitos de autor da lei europeia, a qual o Brasil segue. A vertente europeia se baseia no princípio de que quem cria se esforça para fazer sua obra e, portanto, deve ser recompensado. Compreende os direitos morais — garantir que o autor seja creditado por suas obras — e os direitos patrimoniais — garantir que o autor possa monetizar sua obra, recebendo por cada cópia vendida, se assim desejar. Já a vertente do copyright foca mais nos direitos patrimoniais — especificamente sobre a proteção da cópia.

Um grande debate que sempre existiu dentro dessa área é: até onde essa proteção deve existir? Por um lado, se o autor não é protegido e seu trabalho é difundido e utilizado sem que ele seja remunerado, as profissões criativas seriam insustentáveis e a cultura sofreria. Por outro, se o público sequer consegue ter acesso às obras, o conhecimento fomentado por elas não atinge ninguém, e a inspiração para a criação de novos conteúdos se torna escassa. Esse debate se tornou ainda mais importante com o advento da internet, que facilitou o acesso à todo tipo de obra: livros, músicas, filmes, jogos, etc.

A indústria fonográfica foi umas das que mais se abalou com a expansão da internet. No início do século, com o Napster, tecnologias P2P e a distribuição gratuita de mp3s ilegais na internet, a venda de CDs caiu drasticamente. A indústria publicou diversos estudos pouco transparentes e que hoje são muito questionados sobre os efeitos adversos da pirataria. Um contra-argumento que vale a pena destacar é que nem todo download se traduziria numa venda: no caso de países emergentes, como o Brasil, a população simplesmente não tinha poder de compra para consumir os produtos originais, de modo que sem a pirataria, boa parte das obras jamais atingiria um público considerável por aqui.

A internet também proporcionou uma oportunidade única de ligar diretamente os artistas e criadores de conteúdo com sua audiência. Hoje, os fãs podem apoiar diretamente artistas independentes através de sites como Patreon ou Bandcamp. Porém, a maioria esmagadora do mercado fonográfico ainda é composto de artistas com contratos assinados pelas grandes gravadoras. Isso significa que a a cadeia de produção musical acaba de ganhar um novo participante: os donos das plataformas de internet — Youtube, Spotify, etc.

Antes de prosseguir, cabe aqui explicar o significado de alguns termos. Dentro dos direitos autorais existe o direito de reprodução — isso seria a reprodução mecânica de uma cópia da obra, como tocar um CD, DVD, etc — e o direito de execução pública, envolvido quando a obra é reproduzida publicamente, seja por meio de um CD ou ao vivo, como em cinemas, bares ou transmitida via rádio e TV. No Brasil, a organização responsável por fiscalizar, cobrar e repassar o dinheiro proveniente da execução pública de uma obra é o ECAD. Os direitos envolvidos na produção de um fonograma são os direitos de autor — responsáveis pela escrita da letra e da melodia — e os direitos conexos — atribuídos aos intérprete(s), músico(s) e produtor(es).

Em 2014, graças ao sucesso do modelo streaming, a indústria fonográfica voltou a lucrar, mas isso não se traduziu em ganhos para os artistas. Tradicionalmente, para cada cópia física ou digital vendida de um álbum ou single, 1/3 do dinheiro ia para os autores e 2/3 para os conexos. No caso de execução pública, principalmente em shows, 2/3 do dinheiro ia para os autores e 1/3 para os conexos. Dessa forma, vendendo CDs e fazendo shows, o artista — tanto autores como músicos — conseguia uma renda balanceada. Hoje, porém, quando uma faixa é streamada no Spotify, 26% do dinheiro fica com a plataforma — para cobrir manutenção da estrutura e eventuais propagandas — 65% vai para os conexos e apenas 9% fica com o autor. Não é a toa que comumente surgem notícias de artistas que removem todo seu catálogo da plataforma: não se trata de um modelo sustentável.

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